No momento da celebração de um contrato de seguro de vida entre os principais riscos a segurar deparamo-nos frequentemente com a cobertura do risco de morte, a título de cobertura principal, e do risco de invalidez absoluta e definitiva (doravante, “IAD”), a título de cobertura complementar, destinada a acautelar situações em que, em consequência de um acidente ou de doença, o segurado fica incapacitado definitiva e permanentemente de exercer uma atividade remunerada e, naturalmente, impedido de satisfazer o compromisso assumido contratualmente.
Deste modo, as condições gerais e especiais da apólice de um seguro de vida tendem a prever como requisitos para o acionamento da cobertura de IAD que o segurado fique total e definitivamente incapaz de exercer qualquer atividade remunerada, e que fique obrigado a recorrer à assistência permanente de terceira pessoa para realizar os atos ordinários da vida corrente, em concreto, alimentar-se, lavar-se, vestir-se e deslocar-se na sua residência.
Contudo, importa salientar que, em regra, o contrato de seguro se trata de um contrato de adesão composto por cláusulas pré-elaboradas e, posteriormente, moldadas pelo segurador às circunstâncias específicas do caso, designadamente em consideração à declaração inicial do risco pelo tomador do seguro, razão pela qual se encontra sujeito ao regime das cláusulas contratuais gerais, previsto no Decreto-Lei n.º 446/85, de 25 de outubro.
Posto isto, importa alertar o mercado segurador que a jurisprudência portuguesa tem vindo a considerar, com destaque para o recente Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa de 08.02.2024, Processo n.º 781/12.9TBSXL-A.L 1-8 (disponível em www.dgsi.pt), este tipo de cláusulas como abusivas e contrárias à boa-fé e, por isso, nulas nos termos dos arts. 12.º, 15.º e 16.º do Decreto-Lei n.º 446/85, de 25 de outubro.
Esta posição, cada vez mais maioritária na jurisprudência, tem a sua base no entendimento de que a verificação cumulativa de (i) uma situação de incapacidade total e definitiva para exercer qualquer atividade renumerada, e (ii) da necessidade de recurso ao auxílio de terceira pessoa para a realização de atos da vida corrente reduz de forma substancial e desproporcionada os casos de verificação do risco de cobertura de invalidez, e não coincide, de todo, com o objetivo negocial visado pela partes, ou seja, assegurar a cobertura do risco de impossibilidade de auferir os rendimentos necessários ao cumprimento das obrigações legal e contratualmente assumidas pelo segurado.
Ora, se a cobertura de IAD visa acautelar as situações em que o segurado, por força de uma situação externa, sofre uma perda definitiva e permanente da sua capacidade para auferir os rendimentos necessários ao cumprimento das obrigações contratualmente assumidas, tal circunstância significa que o acionamento da cobertura de IAD somente deve depender da predita perda de capacidade, e não da dependência de uma terceira pessoa para a realização de atos ordinários da vida corrente, em consonância com o que tem vindo a ser decidido pelos tribunais portugueses.
A consideração de uma cláusula de IAD como abusiva não dispensa uma análise casuística e, neste sentido, a equipa de advogados do Departamento de Direito dos Seguros da Belzuz Abogados detém uma larga experiência na análise, revisão e negociação de cláusulas em apólices de contratos de seguro, tanto na perspetiva das empresas de seguros, como no âmbito de defesa dos direitos dos consumidores.
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