Jueves, 12 Mayo 2022

O Direito ao esquecimento nos contratos de seguros

VolverO Direito ao esquecimento nos contratos de segurosEntrou em vigor no início deste ano a Lei 75/2021, de 18 de novembro que veio reforçar o acesso ao crédito e aos contratos de seguros por pessoas que tenham superado ou mitigado situações de risco agravado de saúde ou de deficiência, proibindo práticas discriminatórias e consagrando o direito ao esquecimento. Apesar de ainda existirem inúmeras interrogações quanto à aplicabilidade e exequibilidade deste diploma, importa analisar algumas das implicações que o mesmo poderá vir a ter no âmbito do mercado segurador.

O direito ao esquecimento já se encontra previsto em outros ordenamentos jurídicos europeus, como por exemplo França, Países Baixos, Bélgica ou Luxemburgo, estando agora a dar os primeiros passos no nosso país. A ideia subjacente a este direito é a de que uma pessoa que tenha superado ao longo da sua vida um problema grave de saúde ou de deficiência, não possa ser prejudicado ou discriminado no âmbito do acesso ao crédito à habitação e ao consumo, bem como aos contratos de seguros associados aos referidos créditos. Inicialmente pensado sobretudo para pessoas que tivessem superado o cancro, o diploma alargou posteriormente o seu âmbito de aplicação passando a incluir também outras doenças.

O primeiro aspeto a destacar é que este regime apenas se irá aplicar aos consumidores, excluindo-se, no entanto, os beneficiários do regime de concessão de crédito bonificado à habitação a pessoa com deficiência. Por outro lado, no que concerne à contratação de seguros, o âmbito de aplicação por excelência desta Lei serão os contratos de seguro de vida associados ao crédito à habitação, embora não seja de excluir que possa aplicar-se também aos contratos de seguro de vida de previdência.

Para uma melhor compreensão do diploma, importa também esclarecer o conceito de “pessoas com risco agravado de saúde”. Assim, estarão nesta situação as pessoas que sofram de toda e qualquer patologia que determine uma alteração orgânica ou funcional, de longa duração, evolutiva, potencialmente incapacitante e que altere a qualidade de vida do portador a nível físico, mental, emocional, social e económico e seja causa potencial de invalidez precoce ou de significativa redução de esperança de vida.

Esta Lei veio prever que estas pessoas não possam ser sujeitas a um aumento de prémio de seguro ou exclusão de garantias de contratos de seguro. Para além disso, nenhuma informação de saúde relativa à situação médica que originou o problema de saúde / deficiência poderá ser recolhida ou objeto de tratamento pelas instituições de crédito ou seguradores em contexto pré-contratual. Ou seja, as empresas de seguros não poderão solicitar nenhum dado de saúde sobre a referida situação desde que tenham decorrido de forma ininterrupta, os seguintes prazos:

a) 10 anos desde o término do protocolo terapêutico, no caso de risco agravado de saúde ou deficiência superada;

b) Cinco anos desde o término do protocolo terapêutico, no caso de a patologia superada ter ocorrido antes dos 21 anos de idade;

c) Dois anos de protocolo terapêutico continuado e eficaz, no caso de risco agravado de saúde ou deficiência mitigada.

Uma das críticas que se poderá apontar é que, se é verdade que o diploma estabelece objetivamente os casos em que uma pessoa supera uma situação de risco agravado de saúde ou de deficiência, o mesmo já não acontece nos casos de mitigação, deixando no ar inúmeras dúvidas interpretativas e colocando mesmo em causa a exequibilidade desta parte da norma.

A Lei 75/2021 veio também alterar o artigo 15º da Lei do Contrato de Seguro e aditar os artigos 15º-A e 15º-B a este diploma. Não obstante se tratar de um outro regime jurídico, a verdade é que apenas uma leitura conjunta com estes artigos permite uma compreensão integral da Lei do Direito ao Esquecimento.

No que a este tema mais importa, cumpre destacar especialmente o artigo 15º-A da Lei do Contrato de Seguro, onde se estabelece que o Estado deverá celebrar e manter um acordo nacional relativo ao acesso ao crédito e a contratos de seguros (“ANACS”) por parte de pessoas que tenham superado ou mitigado situações de risco agravado de saúde ou de deficiência. Este acordo será celebrado com as associações setoriais representativas de instituições de crédito e das empresas de seguros e resseguros e terá como objeto, entre outras coisas:

- Assegurar o acesso sem discriminação ao crédito à habitação e ao crédito ao consumo por parte deste grupo de pessoas;

- Definir categorias específicas de dados e informações que possam ser exigidas e operações de tratamento desses dados e informações e das suas garantias de sigilo;

O ANACS irá também definir um procedimento de fixação de uma grelha de referência, a qual será pública, que permita definir os termos e prazos para cada patologia ou incapacidade, em linha com o progresso terapêutico, os dados científicos e o conhecimento sobre o risco de saúde, de crédito ou segurador que cada patologia ou incapacidade represente.

Este ANACS irá funcionar assim como um ponto de referência deste regime, essencial para, esperemos, se poder aplicar a Lei 75/2021 em toda a sua plenitude. No entanto, uma vez que o aludido ANACS ainda não foi celebrado, nem se prevê que o venha a ser num futuro próximo, o regime do Direito ao Esquecimento continuará a suscitar inúmeras dúvidas, nomeadamente no que concerne à sua aplicabilidade a determinadas doenças.

Em conclusão, apesar de ser de aplaudir o objetivo inicial desta Lei, no sentido de impedir atos discriminatórios relativamente às pessoas que se encontrem nas situações por ela abrangidas, a verdade é que a ausência de uma linguagem clara e da referência às patologias a que a mesma se aplica, colocou um enorme problema a todo o mercado segurador que, apesar de pretender aplicar a lei, não tem em seu poder todas as ferramentas necessárias para o fazer, sendo por isso necessária uma análise cuidadosa e criteriosa dos processos, nesta fase inicial de aplicação.


Artículo publicado na revista Atualidad€ - Câmara de Comércio e Indústria Luso Espanhola (CCILE)

 Luis Filipe Faria Luis Filipe Faria

Departamento de Derecho del Seguro | Portugal

 

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