Na prática, surge um número significativo de questões, que são também de grande importância, não só entre os cônjuges membros da sociedade de responsabilidade limitada, mas também em relação à própria sociedade e em relação aos outros sócios. Não se deve esquecer que a sociedade de responsabilidade limitada (S.L.) é um, se não o maior, dos veículos utilizados para conduzir os negócios familiares em Espanha.
Assim, à primeira vista, colocar-se-ão questões como as seguintes, entre muitas outras questões possíveis:
- No caso de acções comunitárias, quem é o cônjuge que tem o exercício dos direitos da empresa (participação em reuniões, direito de voto, etc.) e se o cônjuge do sócio também tem esses direitos dentro da empresa e como exercê-los.
- Em caso de crise conjugal ou, por qualquer outra razão, de dissolução da comunidade de bens, a quem devem ser atribuídas as acções; ao cônjuge que as detém na empresa, para as dividir entre os dois ou ao cônjuge que não as detém?
- Através da liquidação da comunidade de bens, podem os sócios involuntários entrar na sociedade de responsabilidade limitada, que é uma sociedade fechada por natureza, e perturbar a chamada "affectio societatis", segundo a qual os outros sócios concordaram em entrar na sociedade com base nas qualidades pessoais do sócio, qualidades que não estariam presentes no cônjuge não proprietário?
Tendo em conta o acima exposto, que, como foi salientado, são apenas algumas das abordagens que podem surgir, a primeira coisa a ter em conta ao constituir uma empresa ou quando um dos cônjuges se torna sócio de uma sociedade anónima é se as acções adquiridas terão ou não o estatuto de propriedade comunitária. Desta forma, o cônjuge sócio, a empresa e os outros sócios estarão cientes da situação desde o início e poderão tomar medidas para prevenir ou corrigir os efeitos indesejáveis que possam surgir da consideração das acções como propriedade da comunidade.
A este respeito, há que ter em conta que existem vários critérios que podem fornecer uma base jurídica para a classificação como propriedade comunitária:
O critério do momento da aquisição
Nos termos do artigo 1.346.1 do Código Civil, são os seguintes os bens pessoais de cada um dos cônjuges:
"1º Os bens, animais e direitos que lhe pertenciam no início da união".
O critério é claro, mas deve notar-se que o início da comunidade de bens não coincide necessariamente com o início do casamento, uma vez que em virtude de um acordo entre os cônjuges (contratos de casamento) é possível variar o regime económico do casamento. Portanto, tenha sempre o cuidado de não identificar o início da comunidade de aquisições com o início do casamento. É o início do regime da comunidade de bens que é a linha orientadora.
Por conseguinte, as acções adquiridas antes do início do regime da comunidade de bens serão propriedade do cônjuge adquirente.
O critério da onerosidade da aquisição
Critério previsto no artigo 1346.2 C.C., segundo o qual os bens, animais e direitos adquiridos gratuitamente por qualquer dos cônjuges após o início da união de facto são propriedade de cada um dos cônjuges. Ou seja, os adquiridos por doação, herança ou legado.
Inversamente, as acções adquiridas por um cônjuge em virtude de um acto oneroso, como a compra, venda, troca, etc., são propriedade da comunidade.
O chamado "critério da sub-rogação real"
Este está estabelecido no artigo 1346.3 do Código Civil, segundo o qual os bens e direitos adquiridos à custa ou em substituição de bens separados são propriedade de cada cônjuge.
Para que este critério se aplique, devem ser cumpridos os seguintes requisitos:
- A substituição ou substituição de um bem ou direito de propriedade por outro.
- A relação causal ou a relação lógica directa entre a coisa alienada ou perdida e a coisa que a substitui.
- E a permanência inalterada da mesma situação legal, apesar da mudança das coisas operada.
Em relação a este critério, é necessário ter em conta as disposições de 1.354 C.C., para os casos de aquisições mistas, ou seja, aquelas feitas com dinheiro ou serviços em parte em comunidade de bens e em parte em propriedade privada. Este artigo estabelece que "devem corresponder pro indiviso à comunidade de bens e ao cônjuge ou cônjuges na proporção do valor das respectivas contribuições".
O legislador alarga também este regime aos casos de fundação de empresas e estabelecimentos durante a vida da sociedade por qualquer dos cônjuges, se tanto o capital privado como o comum contribuírem para a sociedade (art. 1.347.5 C.C.). O Art. 1.347.5 C.C. diz o seguinte:
São propriedade comunitária: "Empresas e estabelecimentos fundados durante a duração da parceria por qualquer dos cônjuges em detrimento do bem comum. Se a constituição da sociedade ou estabelecimento envolver tanto capital privado como capital comum, aplicam-se as disposições do artigo 1354".
Aplicando os critérios acima referidos, em princípio, a participação seria de natureza privada, comunitária ou mista, dependendo da natureza privada ou comunitária da contribuição monetária ou da contribuição in natura.
Critério da titularidade anterior
Este critério aplica-se no caso de direitos de subscrição preventiva e no caso da emissão de acções a partir dos lucros e sem contrapartida paga pelos accionistas.
O artigo 1.352 C.c. prevê: "As novas acções ou outros títulos ou participações da sociedade subscritos em consequência da titularidade de outros títulos ou participações próprias serão igualmente proprietários. Do mesmo modo, as somas obtidas com a alienação do direito de subscrição serão também privadas".
Pelo contrário, pode entender-se que se os títulos em virtude dos quais os novos títulos são adquiridos forem de natureza proprietária, os novos títulos adquiridos em virtude do direito de subscrição preventiva serão também de natureza proprietária. Se tiverem sido adquiridos com dinheiro ou benefícios privados de um dos cônjuges, surgirá um direito de resgate a favor do cônjuge fornecedor dos fundos.
No caso de acções emitidas a partir dos lucros da empresa, quando não houver necessidade de o sócio as pagar, estas acções serão de natureza não proprietária se as acções anteriores fossem de natureza proprietária, dando origem a um direito de reembolso a favor da comunidade de bens.
Finalmente, para além dos critérios legais acima mencionados, devemos também considerar que às acções da empresa, independentemente da origem do dinheiro ou do serviço com que são adquiridas, pode ser atribuído um carácter de propriedade comunitária por acordo dos cônjuges. Isto está previsto no Art. 1.355 C.C.
"Os cônjuges podem, de comum acordo, atribuir o carácter de propriedade comunitária aos bens que adquirem a título oneroso durante o casamento, independentemente da origem do preço ou da contraprestação e da forma e condições em que é pago.
Se a aquisição for feita em conjunto e sem atribuição de quotas, presume-se que a sua vontade será a favor da natureza de propriedade comunitária de tais bens.
Esta é uma atribuição de compropriedade que deve ser expressa, no primeiro caso contemplado, enquanto no segundo parágrafo, a atribuição de compropriedade seria presumida.
Tendo revisto os critérios com base nos quais se pode determinar se as acções adquiridas são conjugais ou não, podemos agora voltar às questões colocadas no início e ver quais são as respostas de acordo com os textos jurídicos, jurisprudência e doutrina.
Quem é o cônjuge que tem o exercício dos direitos da sociedade (participação em reuniões, direito de voto, etc.) das acções da comunidade? O cônjuge do parceiro pode também exercer estes direitos no âmbito da sociedade em comandita?
A fim de abordar esta questão, é necessário ter em conta que a comunidade de bens é concebida no nosso sistema jurídico como uma comunidade de tipo germânico em que ambos os cônjuges são co-proprietários dos bens comuns e não de metade dos bens que os compõem. Isto significa que nenhum dos cônjuges tem uma participação em bens específicos e, por conseguinte, não pode transferi-la para terceiros. A comunidade de bens é uma comunidade em que ambos os cônjuges são co-proprietários do conjunto, mas não de bens individuais.
Com base no que precede, esta questão foi resolvida pela Jurisprudência e Doutrina sob a consideração da dupla perspectiva que o assunto tem; a consideração ou perspectiva patrimonial ou substantiva e a consideração mercantilista na esfera da empresa.
De acordo com esta dicotomia, entende-se que, a nível substantivo (propriedade), ambos os cônjuges são titulares das acções, mas a nível societário, o estatuto de sócio é apenas o do cônjuge que é o titular (em cujo nome estão registadas) das referidas acções, e não o do seu cônjuge. E isto porque o estatuto de sócio é "intuitu personae", ou seja, as aptidões ou condições pessoais do sócio accionista podem ter sido decisivas para que os outros sócios tivessem concordado em formar uma sociedade ou nela estar, o que não seria o caso da pessoa do cônjuge não proprietário.
O accionista é o cônjuge com direito, enquanto o outro cônjuge tem direito económico às acções. A questão é muito importante porque, na prática, por exemplo, se ambos os cônjuges são parceiros e desejam que apenas um deles actue como tal no futuro, a simples atribuição do voto a favor de um deles não será suficiente, mas será necessário efectuar uma transferência formal das acções, mesmo sem alterar a sua natureza lucrativa, de um para o outro, seguindo um dos mecanismos causais permitidos pelo direito civil para a transferência de bens entre cônjuges. Se a intenção for que o cônjuge não membro se torne sócio, será também necessário realizar a transacção legal formal que dá origem a esta situação, tal como uma compra e venda. Estes exemplos são apenas algumas das muitas situações que podem surgir.
Embora esta solução pareça ser clara, existem, no entanto, casos que poderiam ser considerados contraditórios. Assim, quando o parceiro casado na comunidade de bens é separado ou divorciado e a comunidade de bens é dissolvida e liquidada, por vezes surge um conflito entre o cônjuge e a sociedade de responsabilidade limitada; o cônjuge, que se considera co-proprietário das acções assumidas pelo parceiro casado, procura exercer os direitos de um parceiro e aproxima-se da sociedade de responsabilidade limitada com esta intenção.
Com base no que vimos, é fácil rejeitar tal pretensão quando o cônjuge pretende, por exemplo, participar na assembleia geral ou votar ou ser nomeado director ou contestar resoluções da sociedade ou exercer o direito à informação ou solicitar a nomeação de um auditor se a sociedade não for obrigada a auditar as suas contas.
Surpreendentemente, o Registo Comercial respondeu a estes pedidos de nomeação de um auditor feitos pelo cônjuge do accionista com base na seguinte argumentação:
"Uma vez estabelecida a comunidade de natureza patrimonial das acções, é conveniente reiterar a doutrina da DGRN, declarando que qualquer dos membros da comunidade de sociedade patrimonial - mesmo que dissolvida e em fase de liquidação - tem efectivamente o direito de realizar actos de gestão e administração da referida comunidade de sociedade patrimonial, pois é esta a natureza que deve ser atribuída à acção de solicitar ao Conservador Mercantil a nomeação de um auditor...".
Embora já tenhamos visto a regra geral, como podemos ver, o assunto não é isento de controvérsia.
Em caso de dissolução da comunidade do regime de bens e liquidação, a quem devem ser atribuídas as acções da sociedade: ao cônjuge que as detém na sociedade, para as repartir entre os dois ou ao cônjuge que não as detém?
Com base na natureza "intuitu personae" da relação envolvida na sociedade em comandita, parece mais lógico que nas liquidações da comunidade de aquisições que têm lugar em tribunal e onde existem outros bens na comunidade de aquisições, as acções da sociedade devam ser atribuídas ao cônjuge parceiro.
A este respeito, o Acórdão do Supremo Tribunal (TRIBUNAL PLENÁRIO CIVIL) de 28 de Julho de 2020, que julgamos interessante comentar, faz este ponto. Tendo levado a liquidação da comunidade de bens ao Tribunal de Primeira Instância devido a desacordos entre os cônjuges, o acórdão do Tribunal de Primeira Instância determinou que o pacote de acções da comunidade deveria ser vendido em leilão público e as receitas divididas ao meio entre os cônjuges.
O acórdão proferido em recurso pelo Tribunal Provincial decretou que as acções comunitárias seriam atribuídas ao marido com a obrigação de pagar à esposa o valor de metade, tal como proposto pelo contabilista nomeado pelo tribunal. Esta solução está em conformidade com o Artigo 1406.2.º, que oferece uma solução razoável que combina (i) o direito do cônjuge que permaneceu na gestão da empresa familiar de nela continuar, dando-lhe uma percentagem suficiente de acções ou participações para deter a maioria do seu capital (ou seja, do capital imobiliário comunitário); e (ii) o direito do cônjuge não gestor a gerir a operação económica sem diminuir o valor da parte do património imobiliário comunitário que lhe corresponde na liquidação do património imobiliário comunitário.
O marido interpôs um recurso de cassação, solicitando a anulação da decisão de primeira instância.
A SC nega provimento ao recurso, por entender que a atribuição à esposa de acções representativas de 23% do capital a deixaria numa minoria numa empresa controlada pelo seu ex-marido e ex-cunhado, de modo que uma participação minoritária que não permita qualquer influência nas decisões empresariais tem muito pouco valor. Além disso, tornar a esposa sócia de uma empresa controlada pelo seu marido e cunhado equivaleria a puni-la com uma espécie de envolvimento perpétuo, uma vez que é difícil imaginar que um terceiro quisesse adquirir tais acções em tais condições. Por outro lado, mesmo que não houvesse restrições à livre transmissibilidade nos estatutos, não é possível escapar à aplicação das disposições legais sobre a transmissão de acções da sociedade, o que pode desencorajar ainda mais terceiros de se interessarem por tal aquisição, de modo que o assunto acabaria muito provavelmente numa venda pela esposa aos próprios sócios (o seu ex-marido e ex-cunhado) e por um montante certamente inferior ao seu valor real.
Não é preciso muito esforço para imaginar que o resultado final de todo este problema possa ser muito diferente. É por isso que, ao constituir uma empresa ou ao trazer novos sócios, e se os sócios são governados pela comunidade do regime de propriedade, é essencial fazer uma avaliação precoce das circunstâncias e das consequências que possam surgir, para que se possa criar uma infra-estrutura contratual e legal prévia, tendo em conta as diferentes perspectivas legais aplicáveis e evitando efeitos indesejáveis para o património familiar. Na mesma linha, os cônjuges podem e devem considerar a conveniência de acordar um regime matrimonial diferente, ou estabelecer, quando apropriado, se as acções da empresa são ou não de natureza lucrativa, dentro das possibilidades concedidas pela lei. Por conseguinte, é importante procurar aconselhamento e na Belzuz Advogados somos especialistas nesta matéria, pelo que teremos todo o prazer em fazê-lo e fazer um trabalho preventivo, estabelecendo soluções para que não haja perturbações ou efeitos indesejados na empresa familiar em resultado dos problemas acima descritos.
Departamento Direito Comercial e Societário | Madrid (Espanha)
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